Nossas conquistas são probabilidades ou vontade do universo?


Joaquim Luiz Nogueira 


Nossas conquistas são probabilidades ou vontade do universo?

                                               “Nosso conhecimento é probabilístico”[1].

O grande teórico norte americano Dain Heer[2], autor de vários livros, entre eles, “Sendo Você, Mudando o Mundo” espécie de manual de barra de access com infinitas possibilidades. E dentro deste universo, ele defende que: o ponto de vista humano pode criar realidade.
Para Dain Heer, o fato de indagarmos algo, provoca toda uma reação no universo, pois ele tende a nos oferecer uma resposta sobre a pergunta em questão.  Tudo é possível, porém, em variáveis imediatas até infinitas de tempo, e sua frase preferida seria parafraseando o texto bíblico: peça e receberás.   
Aqui faremos um paralelo entre Dain Heer e a energia quântica do Princípio da Incerteza de Werner Heisenberg, descrito por Vinicius Carvalho da Silva, mestre em Filosofia da Ciência e Teoria do Conhecimento. Segundo a equação de Schrodinger, a chamada partícula de elétron se ramifica em diversas realidades superpostas e respondem as probabilidades segundo as coordenadas espaciais e temporais.
O que significa dizer que o elétron, antes de ser observado, ele existe em todos os lugares possíveis e com todos os níveis de energia possíveis e em todas as velocidades possíveis, mas com distribuição desigual de probabilidades para cada uma destas realidades potenciais:

De acordo com a equação de Schrödinger, podemos inferir que, enquanto não sofrer um colapso observacional, o elétron se ramifica em diversas realidades superpostas, em cada qual apresentará uma maior probabilidade de ser identificado a um vetor que relacione suas coordenadas espaciais (x,y,z) em um espaço de Hilbert com uma coordenada temporal t.2 Ou, seja, de acordo com esse modelo, o elétron, antes de ser observado, existe em todos os lugares possíveis, com todos os níveis de energia possíveis e em todas as velocidades possíveis, mas com distribuição desigual de probabilidades para cada uma destas realidades potenciais.(SILVA, 2014, p.3).

A energia desta partícula (elétron) interage com a natureza ao gerar um campo de força em sua vizinhança quando se move, assim como na pessoa que lhe observa, já que o corpo humano possui trilhões de moléculas e estas por sua vez contem elétrons. Neste contexto, ao fazermos uma pergunta ao universo, logo, como  esta partícula existe em todos os lugares possíveis e nos diferentes níveis de energia e velocidade, o tempo de resposta também pode variar entre o imediato e o infinito.
De acordo com a equação de Schrödinger, todas as probabilidades são concomitantemente reais. Sendo assim, no nível quântico, uma probabilidade deixa de ser compreendida como uma “possibilidade” e passa a ser entendida como uma “potentia objetiva do mundo” (SILVA, 2014, p.3).

Se partirmos do princípio de que podemos acessar possíveis comunicações sem os limites de tempo e espaço, logo, a simples evocação via pensamentos, imagens, palavras ou escritas, estabelecem elos com seus destinatários, mesmo que estejam distantes. Tal conversação ou retornos dependem de infinitos fatores semelhantes aqueles que constroem as realidades, isto é, se encontram em constantes processos de construção e necessitam de certas afinidades de valores para acontecerem:

Nosso conhecimento sobre o nível quântico, de acordo com tal princípio, será sempre “inexoravelmente” limitado. O máximo que podemos obter com relação a estes dados são seus valores prováveis, mas nunca seus valores exatos. (SILVA, 2014, p.4).

Todas as perguntas que fazemos ao universo podem ser interpretadas segundo o princípio de incerteza formulado por Werner Kart Heisenberg, teórico alemão responsável pela criação da mecânica quântica. Nela nunca vamos poder conhecer ou observar com precisão, pois até a própria natureza, de acordo com ele, não possui valores definidos e precisos:
A implicação epistemológica deste princípio é a limitação inevitável do empreendimento intelectual em face da natureza. Nunca conheceremos a natureza com absoluta precisão, ou porque nunca “podemos” observá-la precisamente (como defendem os que postulam que a incerteza é provocada por uma inevitável perturbação entre os instrumentos de medida e os objetos medidos) ou porque a própria natureza não possui valores precisos (como postulam os que defendem a tese de que a incerteza é uma característica necessária, ontológica, da própria natureza quântica). (SILVA, 2014, p.4).

Ao nos interrogarmos sobre se podemos ter um dia maravilhoso, segundo a teoria de Dain Heer, estamos fazendo uma pergunta ao universo, que iniciará a partir deste questionamento, toda uma ação para atender aquele pedido, o que não significa uma resposta imediata, pois depende de uma gama de elementos, cujo indivíduo ainda não possui o conhecimento, e logo, o resultado pode ser um arranjo do que foi possível para aquele dia.
O período de tempo em que o indivíduo desejou ser maravilhoso não depende exclusivamente dele, portanto ele questionou o universo, que devido a incerteza da pessoa, outros dados também podem não contribuir junto a esta realização, assim, o encadeamento não ocorre da forma almejada:
Isto ocorre porque se há incerteza acerca de x, então não posso determinar com precisão nem o estado passado de x, nem seu estado futuro, bem como não posso determinar de modo inequívoco um encadeamento causal entre os diferentes estados de x em diferentes momentos do tempo. (SILVA, 2014, p.4).

De acordo com esta teoria do princípio da incerteza, outra maneira de interpretar pode se dizer que é a realização do objeto desejado por meio da existência de  uma experiencia específica já estabelecida pelo indivíduo, na qual, já determinou de forma qualitativa o que seria maravilhoso naquele dia, valores que o mesmo considera como magnifico, portanto, uma interpretação positiva daquilo que irá presenciar naquele período de tempo: 
Assim, segundo essa concepção, o que confere legitimidade física a um conceito, e significado ao termo que o designa, é a existência de uma operação experimental claramente especificada por meio da qual se estabeleça a aplicação do conceito e, no caso dos conceitos quantitativos, se lhe possa atribuir um valor numérico preciso. Essa interpretação operacionalista estava naturalmente associada à perspectiva filosófica positivista que dominou o cenário intelectual da primeira metade do século XX. (CHIBENI 2005)

Outro exemplo da teoria de Dain Heer, seria perguntar ao universo: Posso gerar paz e tranquilidade onde permaneço? Tais pretensões complexas diante das infinitas possibilidades, após acrescentar o que ele chama de enunciado aclarador: Certo e Errado; Bom e Mau; POD e POC Curtos, Garotos e Aléns Todos os noves, faz o jogo recomeçar.
A ideia pregada por Heer é de que devemos começar deletando qualquer julgamento de nossa mente, uma vez feito isso, estaremos preparados para uma conexão com o universo e sua complexidade, no sentido de ver o mundo como lugar de infinitas possibilidades, desde que o indivíduo possa compreender que sua maneira de agir também faz parte deste universo.
Ao desenvolver a responsabilidade de não julgamento e se identificar com as questões voltadas para alegria de si e de outros, logo, se produz ondas de energias positivas que contagiam o próprio indivíduo e as pessoas que o cercam. Entre os diversos mantras de seu livro, podemos citar: “Tudo vem a mim com facilidade, alegria e glória”.
Tais mantras, aliados aos exercícios de relaxamentos definidos com “barra de access”  que são mais de 30 pontos do corpo para praticar uma espécie de toque ou massagem, torna o individuo muito mais receptivo ao recomeço de novos hábitos saudáveis, alimentados por frases de efeitos positivos, entre elas: como posso contribuir para melhorar o ambiente em que vivo?
De acordo com a teoria de barra de access, ao acessarmos alguns pontos no entorno das orelhas, deletamos informações desnecessária da mente, então, partimos para outros alvos do corpo, onde poderemos melhorar a recepção com o universo, ou seja, ao tocarmos nestes pontos específicos, temos a sensação de voltarmos no tempo e no espaço primordial de origem das emoções e sentimentos. Os sentidos do corpo tendem a uma nova experimentação daquilo que considera como mágico e maravilhoso.
É destes sentimentos ativados que recomeçam uma nova maneira do indivíduo olhar o mundo em que vive, exigindo do mesmo, a repetição deste ritual de toques nos pontos específicos do corpo, até que seus hábitos e modos de agir se transformem em algo capaz de lhe proporcionar alegria, paz e satisfação em tudo o que pratica em seu cotidiano.
O fato do indivíduo poder apagar aquilo que lhe perturba no final de cada dia, promove-lhe a oportunidade de recomeçar novamente de outra maneira com novas possibilidades infinitas. Para isso a teoria de Dain Heer recomenda a insistência em repetir aquilo que deseja ao universo até ser atendido.
Mas o que torna essa teoria de barra de access interessante é como ela aborda o corpo humano, nela a estrutura corporal possui pontos semelhantes ao teclado de um computador, cujo o teórico Dain Heer, chama de “O reino de nós” onde tudo se resume pela escolha do indivíduo.
Na barra de access, temos a banda de implantes, poder, criatividade, conexões, formas de vida, estrutura, esperança, sonhos, consciência, controle, paz, calma, bondade, gratidão, tempo, espaço e comunicação. Cada um destes pontos pode ser acessado pelo indivíduo que deseja melhorar sua recepção junto a estes valores.
Desse modo, deletar ou implantar valores no corpo humano torna se uma possibilidade a partir do toque em pontos específicos. O que ocorre após estas sessões de tempo em que o indivíduo passa massageando tais coordenadas em sua estrutura corporal, corresponde a uma forma de relaxamento, sendo que os efeitos podem variar muito entre as pessoas que submetem a esta teoria, assim como, da compreensão da mesma.
Para Dain Heer, a consciência faz parte de tudo, cujo indivíduo é unidade em tudo, afirma ele, “você é esse espaço entre as moléculas (e átomos) de seu corpo. A parte do átomo que parece sólida é apenas 0,0001 por cento da totalidade do átomo. O resto é espaço, possibilidade e consciência” É neste continuo que se pode navegar, pois, segundo ele, o espaço entre as moléculas e a consciência do corpo pode ser a mesma daquelas que se encontram em uma cadeira, no ar, paredes, prédio, rua, terra, sistema solar, galáxia e no universo inteiro.
Se a consciência faz parte de tudo, logo, o indivíduo também pertence a este universo, no qual estabelece comunicação numa linguagem que, digamos que seja, por conexão ou comunhão com este universo de opções e possibilidades infinitas e desde que possa incorporar nele tais qualidades para alimentá-lo.
De acordo com Dain Heer, o sujeito apenas tem que estar disposto a receber as energias de outra possibilidade, pois ao assumir sua totalidade, a pessoa está aberta para receber tudo, sem exclusões, com facilidade, alegria e gloria, isto é, ele acolhe o bom, o mau, o bonito e o feio.
Toda pergunta ou pedido feito ao universo, logo será levada em consideração se contém julgamento, pois estes impedem a realização daquilo que foi desejado pelo indivíduo. O que aparece é algo diferente ou contrário, pois significa pontos de vistas ajustados ou avaliados que dificultam as realizações.
Portanto, caso o indivíduo receba sua totalidade, menciona Dain Heer, tudo estará bem, então ele passa a existir junto ao universo. No entanto, se ele se comportar com egoísmo e acreditar que é o melhor ou o mais capacitado e que não precisa de outras pessoas, logo, isso não lhe permite receber muito do universo. E esta postura vai exigir do sujeito muito controle e força empenhada para colocar coisas em existência.
Trata-se da maneira de estar no mundo, podemos nos situarmos no comando via egoísmo, julgamentos e avaliações. Assim, teremos que matar um leão por dia e levantar todas as manhãs pensando numa maneira de sair fora desta tarefa exaustiva. De outro lado, podemos escolher a proposta de Dain Heer, isto é, receber o infinito e sua energia de totalidade, uma sensação de estar vivo, livre da responsabilidade de julgar ou avaliar tudo no seu entorno e então gritar: sou um ser infinito e não estou preso numa bolha.
Dain Heer, afirma que é muito difícil viver em uma realidade relacionada a uma constante negociação: “Se eu lhe der isso, o que obtenho?”  E “Se eu aceitar isso, o que tenho que dar a você?” Há outra alternativa segundo ele, pois, como um ser infinito podemos optar por receber tudo, isto significa, que tem de escolher tal opção e pedir ao universo para destruir todas as barreiras que lhe impedem de fazer esta alternativa.
Todos os problemas que temos estão relacionados aquilo que não estamos dispostos a receber, assegura Dain Heer, já que na realidade, temos que nos lembrar constantemente o que escolher ou receber. De acordo com ele, não somos ensinados sobre o fato de sermos uma unidade em tudo o que existe, logo, nada deve ser julgado.
Dessa maneira, aceitando a totalidade da energia do ser infinito que somos, sentiremos a presença de como é estar vivo segundo Dain Heer. E teremos a bondade, o cuidado, a gentileza e a alegria da incorporação no próprio corpo de uma vontade de receber, saber e ser muito mais, sem nenhuma recusa.
Nesta teoria, o indivíduo não deve buscar uma resposta, apena receber a energia daquilo que desejou e refletir sobre se estaria disposto a ganhar sem preconceber o que teria que granjear para ter o que deseja.  Deve estar preparado para receber sem projeções, expectativas, separações, conclusões, julgamentos, rejeições ou respostas prontas de como aquilo que pediu deve ser ou parecer.
De acordo com Dain Heer, somos seres de unidade, sendo assim, o indivíduo deve se importar com ele e com tudo que se encontra a sua volta, pois essa é a única maneira dele ter alegria na sua realidade, isto é, buscando envolver -se e respeitando as escolhas dos outros. Preocupar se com você mesmo e com os outros é algo maior e caminha lado a lado com a alegria segundo Dain Heer. Sem isso não temos abundância ou conexão com o universo para as novas possibilidades, pois é dessa comunhão com a totalidade que gera a jovialidade para viver.
Neste contexto, o individuo pertence a unidade, na qual existe tudo e nada é julgado.  Quando você se separa, também cessa de existir essa conexão com o universo e as coisas parecem ficar pesadas. O contrário disso, buscar coisas verdadeiras e conectadas com a unidade, podem produzir uma sensações e sentimentos de eventos bons, leves ou prazerosos. 
A problemática do indivíduo seria: como posso viver neste estado de gratidão constante de preocupação consigo mesmo e com os outros? Que espaço ou pessoa que conheço na qual poderei vivenciar isso? Para Dain Heer, somente o universo lhe pode oferecer pistas, portanto, peça a ele, sua função é solicitar que isso aconteça e fazer as perguntas.
Perguntar, escolher e ir adiante, desse modo, muitas vezes alerta Dain Heer, você terá que pedir e mobilizar a coragem para ir caminhando, pode até reduzir seu ritmo, mas não deve parar o sujeito. Neste sentido, o individuo estará criando a vida e o mundo de forma verdadeira, da forma que ele gostaria que fosse e no qual, ele também faz parte. 
Concluindo, somos resultados das probabilidades daquilo que nos constituem, isto, desejos, julgamentos, avaliações e escolhas. A cada escolha, decisão ou forma de agir, recebemos com a configuração integral todo o pacote que acompanha tal opção desejada. Por exemplo: decidimos trabalhar em troca de uma quantidade de dinheiro no final do mês, não importa o valor deste salário pouco ou muito, pois aquilo que acompanha esta tarefa, na maioria das vezes, não é pensada pelo indivíduo, já que ele estava concentrado em sua necessidade de um valor monetário para sua sobrevivência.
Neste sentido, todos os problemas e possíveis reclamações pertencem ao contexto que acompanha este trabalho escolhido pelo indivíduo, que o sujeito só vai dar conta, assim que realmente começa sua função na empresa. E para resolver tais coisas indesejadas, ele começa por rejeitar aquilo que não concorda ou que não tem como modificar.
E para resolver isso, Dain Heer, nos oferece a dica: delete tudo o que lhe perturba e escolha novamente. Faça uma nova demanda de desejo para o universo e todos os dias peça para destruir o que não está bom e recrie novamente, solicitando ao universo.


CHIBENI, S. (Certezas e incertezas sobre as relações de Heisenberg). Rev. Bras. Ensino Fís. vol.27 no.2 São Paulo Apr./June 2005.
HEER, Dain. Sendo você, mudando o mundo. Editora: Katarina Wallentin, USA, 2015.
SILVA. Vinicius Carvalho da O “PRINCÍPIO DE INCERTEZA” DE WERNER HEISENBERG E SUAS INTERPRETAÇÕES ONTOLÓGICA, EPISTEMOLÓGICA, TECNOLÓGICA E
ESTATÍSTICA Vinícius Carvalho da Silva Doutorando e Mestre em Filosofia da Ciência e  Teoria do Conhecimento Scientiarum Historia VII . 2014 . ISSN 2176-1248




[1] O “PRINCÍPIO DE INCERTEZA” DE WERNER HEISENBERG E SUAS
INTERPRETAÇÕES ONTOLÓGICA, EPISTEMOLÓGICA, TECNOLÓGICA E
ESTATÍSTICA Vinícius Carvalho da Silva Doutorando e Mestre em Filosofia da Ciência e  Teoria do Conhecimento Scientiarum Historia VII . 2014 . ISSN 2176-1248


O Símbolo Como liberdade que Cria e Potencializa a Realidade


Joaquim Luiz Nogueira 

Artigo Nº 2 - A construção do indivíduo pelo símbolo na teoria de Mircea Eliade

O Símbolo Como liberdade que Cria e Potencializa a Realidade


A construção do indivíduo a partir de símbolos é capaz de oferecer ao sujeito, não só o rumo das coisas, mas o sentido, o interesse, a conexão com a continuidade daquela força que nos puxa em sua direção. Mircea Eliade nos fala que “[...] diante das imagens e dos símbolos que no mundo exótico, tomam o lugar dos nossos conceitos ou que os vinculam e prolongam [...]” (MIRCEA, 1991, p.6).
Essa força que se irradia a partir de um símbolo faz transbordar no corpo humano certo elemento de potência, cuja origem é imaterial, porem compreendida pela mente como imagem, mito, comando, inspiração, criatividade ou sabedoria: 

Melhor ainda, começamos a compreender hoje algo que no século XIX, não podia nem mesmo pressentir: que o símbolo, o mito, as imagens pertencem a substância da vida espiritual, que podemos camuflá-los, mutilá-los, degradá-los, mais que jamais poderemos extirpá-los (MIRCEA, 1991, p.7).

O corpo humano é visto como algo que foi fundido com outra substância, espécie de união que lhe é preexistente, mas uma vez corporificada nele, esta constituição passa a comandar o indivíduo com um entusiasmo muito mais abrangente do que sua limitada estrutura física de carne e osso.
Quando o corpo se encontra na fase infantil, as junções entre o elemento herdado e a mente deixam transparecer esta outra dimensão na forma daquilo que denominamos como inocência. Fase em que os horizontes não possuem limites, pois o pensamento infantil é simbólico, porém, ele também se apresenta-se no adulto.



O pensamento simbólico não é uma área exclusiva da criança, do poeta ou do desequilibrado: ela é consubstancial ao ser humano, precede a linguagem, e a razão discursiva. O símbolo revela certos aspectos da realidade – os mais profundos -  que desafiam qualquer outro meio de conhecimento (MIRCEA, 1991, p.8).

A leitura que cada ser humano faz do mundo, assim como, as devidas ações desencadeadas por ela frente às interpretações de contextos, situações, imagens, mitos e símbolos, todas têm a possibilidade de satisfazer a uma primordialidade, que lhe é necessária e inevitável. São essas visões do sujeito que manifestam outras variantes que lhe incorpora: “As imagens, os símbolos e os mitos não são criações irresponsáveis da psique, elas respondem a uma necessidade e preenchem uma função; revelar as mais secretas modalidades do ser” (MIRCEA, 1991, p.8-9).
As imagens simbólicas são elementos ajustáveis, as mentes humanas as usam como mecanismos que ajudam na sintonia com aquilo que realmente lhe interessa, já que a realidade manifestada diante do indivíduo carrega muitos antagonismos, logo, uma imagem resposta surge em sua mente.

As imagens são multivalentes. Se o espirito utiliza as imagens para captar a realidade profunda das coisas, é exatamente o porquê essa realidade se manifesta de maneira contraditória, e consequentemente não poderia ser expressada por conceitos (MIRCEA, 1991, p.11).

Essas representações que surgem na psique humana imploram pela necessidade de suprir um vazio ou uma lacuna de um tempo já decorrido, no qual foi lhe negado outras possibilidades naquele momento, mas agora, a imagem mental lhe apresenta como o sujeito poderia ter agido e acrescenta novas expectativas para sanar a falha junto ao tempo presente. 



Constataremos que essas imagens invocam a nostalgia de um passado mitificado, transformado em arquétipo, que esse “passado” contém, além da saudade de um tempo que acabou, mil outros sentidos: ele expressa tudo o que poderia ter sido, mas não foi (MIRCEA, 1991, p.13). 

Toda busca pessoal significa certa proximidade com os símbolos que lhe transporta até outras dimensões do tempo, lá é desperto sua obrigação frente à realidade da existência. Eliade chama isso de situação extrema, responsável pelo tipo de participação que temos no cotidiano.

Os símbolos, os mitos e os ritos revelam sempre uma situação-limite do homem, e não apenas uma situação histórica. Por situação-limite entendemos aquela que o homem descobre como tomando a consciência do seu lugar no Universo (MIRCEA, 1991, p.30).

É neste momento que o indivíduo consegue superar sua condição como ser histórico, isto é, no sentido de uma atuação junto à realidade, ele fixa sua vontade de renascer novamente objetivando a realização de seus ideais, aqueles que o levará para sua plenitude enquanto ser ilimitado. “A medida que o homem transcende o seu momento histórico e dá livre curso ao seu desejo de reviver os arquétipos, ele se realiza como ser integral, universal” (MIRCEA, 1991, p.32). 
Os textos sagrados da Antiguidade mencionavam algumas imagens que significavam essa passagem de homem histórico para um ser universal. Esses portais eram representados por escadas ou flutuações que simbolizavam o acesso a esta outra dimensão, veja nas palavras de Eliade: “A escalada ou ascensão denota o caminho rumo a realidade absoluta (MIRCEA, 1991, p.47). 
O indivíduo busca constantemente um estado que se encontra além de sua posição realista, ou seja, do sentimento de aprisionamento, cujo limite é denominado como corpo e a libertação dessa cadeia passa por grandes desafios guiados pela ideia de recuperação de algo perdido.

Compreendemos por isso o desejo de se encontrar sempre e sem esforço no Centro do Mundo, no coração da realidade, e, enfim, de ultrapassar de uma maneira natural a condição humana e de reencontrar a condição divina. Um cristão diria a condição anterior a queda (MIRCEA, 1991, p.51). 

Este elo extraviado do indivíduo, mesmo que não faça parte fisicamente de sua realidade é capaz de retirá-lo de seu tempo, de sua agonia e projetá-lo de forma simbólica para o lugar conhecido como o centro que lhe direciona. É desta dimensão magnífica, cujo acesso se dá apenas pelo símbolo, elemento responsável pela abertura entre o mundo corpóreo e o universo sem limites.
É uma conexão conhecida pelo indivíduo como sensação prazerosa, capaz de liga-lo com forças misteriosas, fios invisíveis, mas suficientes para trazer emoções únicas a cada pessoa. Tal junção forma a metáfora, que conhecemos como vida.
Contentemo-nos em lembrar que um mito retira o homem de seu próprio tempo, de seu tempo individual, cronológico, “histórico” – e o projeta, pelo menos simbolicamente, no Grande Tempo, um instante paradoxal que não pode ser medido por não ser constituído por uma duração. O que significa que o mito implica uma ruptura do Tempo e do mundo que o cerca; ele realiza uma abertura para o Grande Tempo, para o Tempo Sagrado (MIRCEA, 1991, p.54). 

Uma possível linha de interpretação nos leva a conclusão do quanto cada indivíduo é desconhecedor daquilo que movimenta seu corpo rumo ao dia seguinte. Neste aspecto, duas coisas são importantes; a representação pessoal e a circunstância em que se encontra naquele momento, que juntas, definem o que o sujeito significa para si mesmo. E deste modo, outra maneira de fugir desta condição de ignorância humana, seria o indivíduo não se identificar com a representação do que cada um pensa ser ou desejaria tornar-se, com base ao que imagina como seu ideal.


Em outros termos, ultrapassamos a condição temporal e a obtusa suficiência, que são o fardo de todo ser humano, pelo simples fato de ele ser “ignorante”, ou seja, de identificar a si e ao Real com a sua própria situação particular. Pois a ignorância está em primeiro lugar nesta falsa identificação do Real com o que cada um de nós parece ser ou parece possuir (MIRCEA, 1991, p.55).

Este pequeno controle do indivíduo sobre seu mundo de representações, acaba por fugir de seu comando na maioria das vezes, nesse momento de confusão e desespero, aparece a entoação de símbolos, linguagem com a capacidade de lançar o sujeito para outra dimensão, cuja sintonia, provoca nele efeitos emocionais. Dessa forma a pessoa se reconhece como ser limitado, admite não possuir o poder para criar mundos perfeitos, pois não controla sua própria existência, porém, neste estágio se abre uma porta para possibilidades infinitas, desde que ele acredite. 

A recitação periódica dos mitos derruba os muros construídos pelas ilusões da existência profana. O mito reatualiza continuamente o Grande Tempo e dessa forma projeta quem o ouve a um plano sobre-humano e sobre-histórico que, entre outras coisas, proporciona a abordagem de uma Realidade impossível de ser alcançada no plano da existência individual profana (MIRCEA, 1991, p.56).


Acreditar numa outra existência extra corpo é superar os limites desta realidade mundana, é a projeção de todas as ações do indivíduo para um plano que possa mostrar aos outros, numa linguagem simbólica e metafórica, a grandeza infinita de algo que sua mente não consegue compreender totalmente. Essa conexão, uma vez ligada a pessoa, cria possibilidades para que o mesmo se comunique por meio de linguagens simbólicas, modificando a leitura que tem do mundo e suas ações.


Transcender o tempo profano, reencontrar o Grande Tempo mítico, equivale a uma revelação da realidade última. Realidade estritamente metafísica, que não pode ser abordada de outra maneira senão através dos mitos e símbolos (MIRCEA, 1991, p.56). 

Uma das palavras mais simbólicas que pode ser exemplo de metáfora para o ser humano é a liberdade. Este vocábulo possui inúmeros sentido, cujas variações dependem do contexto, contudo na maioria das vezes em que é mencionado, tem a capacidade de desligar o indivíduo de sua rotina. “O homem só pode se desprender através de um ato de liberdade espiritual” (MIRCEA, 1991, p.62)
Entre os adeptos do Budismo, a libertação do tempo que nos aprisiona ocorre com a revogação da existência, isto é, o indivíduo deve deslocar-se de seu corpo: “A única possibilidade de sair do tempo, de quebrar o círculo de ferro das existências é abolição da condição humana” (MIRCEA, 1991, p.63).
Outra forma de alforria seria pelo conhecimento, - entendimento de uma dada situação ou fato. A clareza com que um indivíduo consegue perceber uma circunstância e acreditar na sua convicção o faz sair da existência demarcada. “A iluminação, a compreensão, realiza o milagre da saída do Tempo” (MIRCEA, 1991, p.72). Esta ponte capaz de conectar o indivíduo com outra dimensão fora de seu período pode ser denominada de “fé”, crença inabalável em algo. Se o sujeito realmente acreditar, sua certeza o transportará em segurança até aquele lugar desejado. A convicção é o ponto de descontinuidade com a realidade angustiante, estabelecendo a confiança necessária para manter a pessoa em outro espaço.

Um “Centro” representa um ponto ideal, pertencente não a um espaço profano, geométrico, mas ao espaço sagrado, e no qual se pode realizar a comunicação com o Céu ou o Inferno; em outros termos, um “Centro” é o lugar paradoxal da ruptura dos níveis, o ponto em que o mundo sensível pode ser ultrapassado. Mas pelo fato de transcender o Universo, o mundo criado, transcende-se o tempo, a duração, e obtém–se a estase, o eterno presente intemporal (MIRCEA, 1991, p.72).

Os símbolos traduzem um estado de equilíbrio, capaz de falar com cada sujeito de maneira diferente, pois podem se conectar de acordo com as experiências e o grau de interpretação de cada ser humano. Diante de uma imagem simbólica, alguns podem viajar para fora do tempo, enquanto outros, simplesmente parecem ignorar sua presença.
Segundo Eliade, o símbolo pode representar “O presente total, o eterno presente dos místicos, é a estase, a não-duração. Traduzida ao simbolismo espacial, a não-duração, o eterno presente é a imobilidade” (MIRCEA, 1991, p.78).
O indivíduo vive na fronteira de seu corpo limitador, sonha com o universo ilimitado que se encontra fora de seu alcance. É neste campo infinito que ele: navega, voa, viaja, pesquisa, projeta e idealiza aquilo que estabelece como modo de viver. 


ELIADE, Mircea. Imagens e Símbolos: Ensaio sobre o simbolismo mágico e religioso. Trad. Sonia Cristina Tamer. São Paulo: Martins Fontes, 1991.





Representação de Algo Desejado: Jogo da Ficção



Joaquim Luiz Nogueira 

Artigo 1 -  pertencente a uma série de estudos sobre a construção do indivíduo pelo símbolo, realizado pelo autor, numa busca de compreensão sobre o objeto em questão, no caso, o ser humano. 


Representação de Algo Desejado: Jogo da Ficção

Em uma ação racional do indivíduo, o mesmo, procura resolver os problemas reais adaptando-se ao contexto externo que o rodeia, porém, a imaginação lhe acrescenta novos elementos, cujo efeito simbólico é capaz de submeter à realidade no sentido de satisfazer o sujeito, espécie de jogo que não possui norma ou limite para sua inventividade. A pessoa assimila aquilo que melhor lhe encanta, e isto, passa a orientá-la.

Para orientar-se no sentido da assimilação como tal: em vez do pensamento objetivo, que procura submeter-se às exigências da realidade exterior, o jogo da imaginação constitui, com efeito, uma transposição simbólica que sujeita as coisas à atividade do indivíduo, sem regras nem limitações. Logo, é assimilação quase pura, quer dizer, pensamento orientado pela preocupação dominante da satisfação individual (PIAGET, 2015, p.100). 

De acordo com Piaget, o indivíduo em sua fase infantil de socialização, adota algumas normas, sua imaginação passa a simbolizar os diversos elementos presentes em sua realidade, ou seja, para cada fato o sujeito é direcionado rumo a uma conduta coletiva ou certa representação desejada pelo sujeito, frente aquele momento.

Com a socialização da criança, o jogo adota regras ou adapta cada vez mais a imaginação simbólica aos dados da realidade, sob a forma de construções ainda espontâneas, mas imitando o real: sob essas duas formas, o símbolo de assimilação individual cede assim o passo, quer à regra coletiva, quer ao símbolo representativo ou objetivo, quer aos dois reunidos (PIAGET, 2015, p.100). 



O procedimento que o indivíduo adota é semelhante àquele utilizado numa brincadeira, tendo como princípio, a capacidade de lograr a realidade, ao sujeitá-la a outras opções substitutivas. “Mas reconhecemos que, funcionalmente, a assimilação lúdica (...) é o ponto de partida do símbolo” (PIAGET, 2015, p.115). 
O indivíduo associa cada suposta realidade a esquemas ficcionais, ideais ou situações desejadas, sendo que, nenhuma delas possui vinculação direta com o sujeito, porém são evocadas por intermédio de imitações, ou seja, os objetos ausentes participam por incorporações significativas.

No símbolo lúdico, pelo contrário, o objeto atual é assimilado a um esquema anterior sem relação objetiva com ele, e é para evocar esse esquema anterior e os objetos ausentes que com ele se relacionam que a imitação intervém a título de gesto “significante”. Em suma, no símbolo lúdico, a imitação não diz respeito ao objeto presente e sim ao objeto ausente, que se faz mister evocar (PIAGET, 2015, p.118).

A representação pode simbolizar para uma criança um determinado objeto que está ausente. Diante de uma dada realidade, ela deseja algo impossível como tal se realiza mediante a reprodução de algo semelhante, isto é, se deleita com uma ficção. Deste modo, o indivíduo representa aquilo que está em outro plano, externo a ele, porém, essa personificação se incorpora no sujeito por intermédio da imaginação, algo ilusório ou simbólico que lhe satisfaz na ausência do objeto real.

O símbolo implica a representação de um objeto ausente, visto ser comparação entre um elemento dado e um elemento imaginado, e uma representação fictícia (...). Por exemplo, a criança que desloca uma caixa imaginando ser um automóvel representa, simbolicamente este último pela primeira e satisfaz-se com uma ficção (PIAGET, 2015, p.127).

A fantasia ao simbolizar um desejo do indivíduo, aciona mecanismos capazes de mobilizar realizações difíceis ou problemáticas. Ela contém o princípio da brincadeira, que desencadeia movimentos no sujeito, e esses, amplificam se constituindo em novos elementos e ou outras realidades.

A maioria dos jogos simbólicos, salvo as construções de pura imaginação, ativa os movimentos e atos complexos. Eles são, pois, simultaneamente sensórios-motores e simbólicos, mas chamamos-lhes simbólicos na medida em que ao simbolismo se integram os demais elementos (PIAGET, 2015, p.128).

O indivíduo condiciona a realidade para buscar a concretização de seus desejos a partir da invenção de contrapesos, ou seja, algo que possa equilibrar o antagonismo defrontado diante dele. Com este tipo de ação o sujeito expande aquilo que considera como conquista pessoal. 

Além disso, as suas funções afastam-se cada vez mais do simples exercício: a compensação, a realização dos desejos, a liquidação dos conflitos etc. somam-se incessantemente ao simples prazer de sujeitar à realidade, a qual prolonga, por si só, o prazer de ser causa inerente ao exercício sensório motor (PIAGET, 2015, p.128).

Este comportamento que gera equilíbrio ao ser humano, se desperta pela simulação daquilo que ele deseja, pois, “o simbolismo principia com as condutas individuais que possibilitam a interiorização da imitação” (PIAGET, 2015, p.128).
Quando vários indivíduos decidem imitar os mesmos objetos ou outras condutas pessoais, criam símbolos coletivos. Com este tipo de atitude, o sujeito passa a ter um papel a cumprir, já que todos devem agir de forma semelhante, neste caso, surgem às normas.  “A regra é uma regularidade imposta pelo grupo, e de tal sorte que a sua violação representa uma falta” (PIAGET, 2015, 128).
Diante de uma dada realidade negativa ou desagradável, a maneira encontrada pela pessoa para suportar determinada situação é oferecida a ele pelo símbolo, isto é, por algo que está ausente. “O símbolo lhe fornece os meios de assimilar o real aos seus desejos ou aos seus interesses” (PIAGET, 2015, p.136). Esta construção simbólica se dá por meio de objetos e gestos imitativos do que o sujeito deseja, algo que está ausente no momento. A estruturação ocorre por meio de acordos abstratos, que ao imitar a realidade pretendida, esta lhe serve de instrumento a seu estímulo inventivo.

No ponto de partida, a construção simbólica (o objeto dado e os gestos imitativos a que ele é assimilado) apenas representa situações e objetos sem relação direta (...) são assimilados a um sistema de combinações subjetivas (...) uma reprodução imitativa direta da realidade correspondente, e está só é evocada para servir de objeto ao esforço de compreensão inteligente. (PIAGET, 2015, p.159 -160).

Se a ficção é um elemento do pensamento simbólico da pessoa, a ela, podemos acrescentar também a metáfora, pois esta última conecta a imagem mental do sujeito ao objeto desejado, a junção é feita em sintonia com o sentimento individual de cada pessoa.

Uma metáfora, por exemplo, é um símbolo, porque entre a imagem empregada e o objeto ao qual ela se refere existe uma conexão, não imposta por convenção social, mas sentida diretamente pelo pensamento individual (PIAGET, 2015, p.192).

Esta reciprocidade por meio da inspiração, sensação ou intuição do qual aprimora o indivíduo, e também determina, porém, de forma oposta ao pensamento sociabilizado, isto é, se revela por imaginação, ficção, fantasia, encantamento, inventividade, visão dentre outros.  


Ademais, é um pensamento do qual se sublimou a natureza individual e mesmo íntima, por oposição ao pensamento socializado, porque ele se manifesta sobretudo no sonho e no devaneio.(PIAGET, 2015, p.192).

Cada elemento construído pelo indivíduo mediante ficção pressupõe certa estruturação por relevância, simpatia, afetuosidade ou imagem inventada, “pois todo simbolismo supõe um interesse e um valor afetivo, aliás, como todo pensamento” (PIAGET, 2015, p.194).
As ações advindas de um símbolo se processam por reconhecimentos, adaptações, assimilações, destaques, valores, prestígios, influências, empecilhos, obstáculos e interpretações diferentes. “O simbolismo procede por identificações, projeções, oposições, duplos sentidos etc.” (PIAGET, 2015, p.208).
A definição deste centro gerador que parece estar ausente no indivíduo para Piaget, pela visão de Freud e Jung, localiza-se no chamado inconsciente. Lá encontram-se todas as possibilidades sem nenhum tipo de controle racional ou social, de modo que, o sujeito está livre para fazer todo tipo de associações, segundo seus interesses, sem a censura, de forma que as imagens acessadas se tornam símbolos.

Dito de outra forma, o objeto (ou o significado) do símbolo acha se associado, no inconsciente, a todos os tipos de imagem, mas, sendo esse, objeto censurado, somente são toleradas pela consciência as associações com imagens que não o relembram de maneira demasiado evidente, essas imagens são, portanto, simbólicas na medida em que enganam a censura - e o papel das associações livres, então, é precisamente encontrar aquelas associações inconscientes que foram censuradas no momento da formação do símbolo (PIAGET, 2015, p. 215 - 216).



Neste caso, a racionalidade e a sociabilidade do indivíduo seleciona o que ele deve representar. Alguns pontos estimulam o sujeito é a acessar em nome da civilidade, urbanidade, entre outros e aquilo que não é permitido a conexão através da consciência, faz com que ele se desligue, pois “Isso só é compreensível se compararmos a consciência a um projetor, que ilumina certos pontos e se afasta de outros, pela vontade daquele que o aciona” (PIAGET, 2015, p. 216).
Novamente, o que aciona a percepção está ausente no indivíduo, isto é, do controle que decide iluminar alguns elementos e ignorar outros, entretanto, em certas circunstâncias, reconhecidas como simbólicas, certas conexões escapam desta restrição. Piaget, recorre a Freud que diz “a censura resulta da consciência e o simbolismo é produto de associações inconscientes que enganam a censura” (PIAGET, 2015, p.217).
Assim, para Freud a linguagem dita simbólica seria algo semelhante à comunicação primitiva, uma espécie de economia de pensamento ou disfarce frente às restrições. Estes fatores gerados por limitações provocariam efeitos representativos (disfarces) nos indivíduos.

Freud admitiu que o simbolismo constituía igualmente uma linguagem primitiva, mas é então, ao mesmo tempo, linguagem e disfarce: o mecanismo da “condensação” é nesse caso explicável por simples fatores de economia do pensamento, mas o “deslocamento” permanece sendo concebido como sempre resultante da própria censura (PIAGET, 2015, p.217).

São os impactos dos resultados destas representações elaboradas pelos indivíduos que se transformam em novas finalidades, atualizam realidades, mostram rumos, sentidos, e despertam os interesses dos indivíduos para ações orientadas pela ficção.  

PIAGET, Jean. A Formação do Símbolo na Criança: imitação, jogo e sonho, imagens e representação. Trad. Álvaro Cabral e Christiano Monteiro Oiticica 4ed. Rio de Janeiro: LTC, 2015.

Pensadores do Fórum do Amanhã

Como pensam alguns dos participantes deste fórum do amanhã?


Joaquim Luiz Nogueira 



Entre os pensadores deste fórum do amanhã, três deles são já tradicionais em suas ideias, Domenico de Masi, Eduardo Giannetti e Heloisa Starling, No entanto, os outros quatros, possuem ideias que navegam no limite entre racionalidade e ficção. Vejamos um resumo de suas ideias:

Kdu da Favelinha[i], com projeto social em Belo Horizonte MG, “Kdu tem muitos planos para o futuro. “Além da expansão do espaço físico, desejo que mais oportunidades sejam geradas dentro e fora da Favelinha, desfazendo o estigma que o morador da periferia é condenado a subempregos e modificando a perspectiva de vida das pessoas”,

Ele trabalha com os ideais dos moradores da periferia urbana e que formam a grande maioria dos aglomerados urbanos das grandes cidades, aqueles que segundo ele, “são condenados ao subemprego”. E como se trata de uma grande massa de pessoas e de consumidores, conta com ajuda de voluntários e patrocinadores, incluindo a grande mídia.
Outro pensador deste fórum é o Sidarta Ribeiro[ii] que faz pesquisa nas interfaces entre eletrofisiologia, etologia e biologia molecular, atuando principalmente nos seguintes temas:

1.   Sono, sonho e memória;
2.   Genes imediatos e plasticidade neuronal;
3.   Comunicação vocal em aves e primatas;
4.   Competência simbólica em animais não-humanos.

Para este pesquisador “Todas as noites, bilhões de indivíduos passam horas plugados no mais potente simulador de realidade virtual do Universo. Com ele, podem realizar desejos insuspeitos, explorar os limites da própria personalidade ou descortinar cenários e criaturas surreais. Não se trata de cenário de ficção científica —basta fechar os olhos e sonhar, diz o neurocientista Sidarta Ribeiro”.

O que está em jogo para Sidarta é o “descortinar de novos cenários e as criaturas surreais”. Estes sonhos surreais, segundo o pesquisador, podem fazer parte da construção da realidade das pessoas na formação de um mundo livre, tanto virtual quanto real.

A pensadora Rosiska Darcy de Oliveira é uma jornalista, escritora e acadêmica brasileira, que também participa deste fórum, cujas obras tratam principalmente de temas como o feminismo, a educação e a vida contemporânea. Aqui, embora o tema “educação e a vida” seja polemico, pois busca a introdução da vida cotidiana das pessoas na sociedade, principalmente as diferenças culturais e de gênero.

Outro pesquisador deste evento é Roberto Gambini,[iii] que sendo ele, terapeuta junguiano há trinta anos, Sua grande preocupação intelectual tem sido fazer confluir a psicologia junguiana e as ciências sociais. Segundo ele:

“Ficou o que tinha peso ou o que em mim estava arraigado a partir de um processo real. O tempo tirou coisas que eu dizia, mas que eram apenas teóricas, ou então coisas que eu não tinha vivido. Quando falo de uma coisa que não vivi, minha fala tem pouco ou nenhum efeito. No lugar dessas coisas, o tempo colocou outras, muitas vezes opostas a elas. Ensinou-me a olhar cada vez mais a realidade do paciente como ela é, a não ter medo de entrar nos labirintos onde ele se encontra, a não vir a ele com ideias prontas, a sempre admitir o imprevisível, o não pensado, o não vivido. A acreditar mais e mais no poder da vida, que é o poder de se autopreservar e de criar formas viáveis de existir. Ensinou-me a projetar menos no paciente. A distinguir melhor o que é uma coisa minha e o que é uma coisa dele”.

O que é novo neste pensamento é a forma de respeitar a realidade do paciente como ela é, e admitir o imprevisível, o não pensado, o não vivido. Trata-se de valorizar o que ele chama de “poder da vida”, ou seja, da autopreservação, a maneira de permitir e criar formas variáveis de existência. As novas configurações de sociedade do futuro pertencem, de acordo com este pensador, a um mundo de criação espontânea. A pergunta que fica, talvez seja: será que o capitalismo vai permitir esta existência espontânea? Ou, o consumo será o grande mediador deste novo mundo do imprevisível? Os alimentos e os medicamentos também serão espontâneos? As novas doenças e bactérias poderão ser produzidas?  



O século XVI e o surgimento do pensamento moderno



Joaquim Luiz Nogueira



Segundo Francastel, temos no surgimento do pensamento moderno (século XVI) a “Força da corrente Figurativa” que neste período, quando a coisa que nos encanta ou que nos provoca certo deleite, a ponto de nos transportar mentalmente para outros espaços imaginários, e também, capaz de reunir pessoas em espaços artificiais ao reproduzir  diversos horizontes sentimentais, ou seja, aquilo que “(...) introduz o maravilhoso (...) ilustra efetivamente a coabitação no mundo de um sistema de visualização tradicional e de um sistema inédito (...) os novos horizontes sentimentais” (FRANCASTEL 1983, p.243).
Para ilustrar essa ideia de como o relampejo de algo que nos encanta, pode compor novas ações por meio de um simples transporte via sentimentos, ou em alguns momentos históricos, cujo vislumbre do maravilho, foi capaz de construir ações na realidade de épocas históricas.
Desde o pensamento da Antiguidade, já temos o exemplo do filósofo Sócrates (470 a.C.- 399 a.C.) com sua frase “conheça a ti mesmo” e diante das situações políticas de sua época, ele confiou em sua tese de que, cometendo o suicídio com veneno cicuta, poderia provar aos juízes de seu tempo que sua conduta era justa, mas que naquele universo, não seria compreendido, então, sua postura foi confiar que mesmo com sua morte, suas ideias continuariam a existir, provando sua vitória.
"Eu predigo-vos portanto, a vós juízes, que me fazeis morrer, que tereis de sofrer, logo após a minha morte, um castigo muito mais penoso, por Zeus, que aquele que me infligis matando-me. Acabais de condenar-me na esperança de ficardes livres de dar contas da vossas vida; ora é exatamente o contrário que vos acontecerá, asseguro-vos (...) Pois se vós pensardes que matando as pessoas, impedireis que vos reprovem por viverem mal, estais em erro. Esta forma de se desembaraçarem daqueles que criticam não é nem muito eficaz nem muito honrosa[i]

Dessa maneira, Sócrates enfrentou seus inimigos escolhendo uma alternativa inédita para seu tempo, assim como suas ações em vida, que ensinava seu conhecimento de graça, o que contrariava a classe política de sua época. Também dizia que para se acreditar em algo, era preciso verificar se aquilo realmente era verdade, logo, orientava as pessoas a fazerem perguntas e críticas, tudo o que os políticos não queriam para o povo.
Antes de Sócrates, Buda ou Sidarta, que nasceu em aproximadamente 566 a. C, também ao ficar indignado com o sofrimento, a velhice, a doença e a morte, decidiu dedicar somente a vida espiritual ao desprezar o corpo e a materialidade. Seu objetivo foi a busca da iluminação espiritual e faleceu aos oitenta anos de idade, em 483 a. C.,
Mais tarde, no auge do domínio romano sobre outros povos, entre os judeus, nasce Jesus Cristo, que segundo o evangelho, falava sobre o Reino de Deus, um lugar de justiça, paz e alegria no espírito:  
O Reino de Deus, que não terá fim e que já está no meio de nós (Lc 17, 21), é justiça, paz e alegria no Espírito Santo (Rm 14,17); é o fim último ao qual Deus nos chama;[10] é obra do Espírito Santo;[11] e é também um império eterno que jamais passará e…jamais será destruído (Dn 7,14).[ii]

 E no século XVI, temos o homem que ao buscar a si mesmo, passa a incorporar papéis desejados, isto é, transforma-se em ator. E o ator substitui o homem e Deus. “A Natureza oposta ao Homem substitui Deus englobando em seu pensamento o universo. O Homem se considera a si mesmo, de bom grado, como um ator no teatro do mundo” (FRANCASTEL, 1983, p.244).
Dessa maneira ao criar o cenário e ao escrever sobre o papel ideal do ator, este último, tem a possibilidade de interpretar personagens perfeitos no palco do mundo, assim como, transmitir essa experiência para outras gerações: “a influência da compreensão ritual e eficaz do mundo, assim como a da interpretação racional do universo e que só se explica pela flexível evolução das várias gerações” (FRANCASTEL, 1983,p.245).
O pensamento moderno fez surgir o ator no lugar do homem natural, e juntamente com ele, toda uma nova linguagem, sendo esta, desenvolvida através do espirito científico moderno, ou seja, exigências dos novos cenários do maravilhoso, dos espetáculos que encantavam as pessoas. Estas cenas teatrais materializam-se também nas concepções ideais projetadas para o cotidiano.
“o progresso das novas linguagens reflete essa marcha hesitante do pensamento moderno .... abre caminho as novas experiências ... nascidas do espirito cientifico moderno, as tradições maravilhosas do espetáculo popular. Ele materializa então, no par cena-sala solidários, a concepção ideal do microcosmo – macrocosmo que constitui o fundo da filosofia dos tempos modernos... o século XVI aparece como um período em que as duas tendências se confirmam sem se defrontar nem se fundir. (FRANCASTEL, 1983, p.245).

A partir da cena teatral apresentada pela imaginação do ator, que nasce novos pensamentos na modernidade. Eles são frutos da concepção e do entendimento do indivíduo. “Não é a forma que cria o pensamento nem a expressão, mas é o pensamento, expressão do conteúdo social comum de uma época, que cria a forma” (FRANCASTEL, 1983 p.249).
Portanto, segundo Francastel, é pela presença da coisa vista que se explicam as imagens construídas na modernidade. Elas representam “horizontes vividos”, isto é, alargamentos de contextos materiais, culturais e intelectuais da humanidade, espécie de utopia estética que cria imensos horizontes positivos.
Cerca de 1480 uma mudança radical intervém nos ritos sociais ao mesmo tempo que no sistema figurativo do século. Inspirado até então pela visão dos espetáculos populares, os artistas transpõem o mais das vezes cenas vistas na rua durante verdadeiras liturgias civis mais importantes que os mistérios – que constituem apenas um momento destes e que utilizam aliás igualmente um vasto material de objetos e de emblemas emprestados aos últimos séculos da Idade Média. Esses vastos “espetáculos não-teatrais”, que culminam cortejos e em justas, marcam o ritmo paralelo da vida humana e dos ciclos da natureza; eles pontuam a vida popular das cidades (FRANCASTEL, 1983 p.284).

A mudança do sistema figurativo entre o século XV para o século XVI está no contexto da visão dos espetáculos de mistérios populares que alimentavam as imaginações para as observações de artistas, que ao acompanhar os acontecimentos de rua durante certos rituais ou liturgias, criava em paralelo aos mistérios, alguns recortes, que se transformaram em emblemas, dando origem a um ritmo paralelo na vida humana.
De acordo com Francastel, esta mudança começa ocorrer junto a poesia amorosa, pois “seus versos estão intimamente entremeados ao tecido de sua própria aventura sentimental” (FRANCASTEL, 1983, p.287). Trata-se da incorporação ao imaginário do individuo pela trama que está a sua volta, ou seja, algo imaginado ou sentido que pode renovar a vida.
Assim como um cheiro, um sabor ou um perfume, ambos capazes de anunciar algo que nossa imaginação tem como buscar via memória, possíveis representações semelhantes e aproximadas, pelas quais, podem -se criar ou renovar a vida: “Há portanto no renovamento da vida pelo Amor  como que um presságio daquilo que nos espera depois de nosso fim e eis porque os cantos de amor são dignos de toda atenção; eles são a prefiguração de destino da alma humana” (FRANCASTEL, 1983, p.287).
Esta atitude humana pode atenuar segundo Francastel “a lei dos ciclos eternos” de vida e morte, pois, o perfume do além pode amenizar o desespero do destino por meio da contemplação do maravilhoso. É dessa maneira que a vida tem como triunfar sobre a morte, ela se antecipa o encontro com o deslumbrante, evoca a ideia de um outro mundo.
Para Francastel, quando nos encantamos por uma imagem ou “pela força efetiva de um objeto amado” este age à maneira das forças da natureza que regem o universo: “a amante faz reflorir a alma do amante como a primavera faz reflorir a terra” (FRANCASTEL, 1983, p.290).
Neste contexto do amor do final do século XV, Francastel retoma o pensamento dos platônicos que dizia:” o espírito, os olhos, e os ouvidos podem nos guiar, os outros sentidos apenas  são incuravelmente vis” (FRANCASTEL, 1983, p.291). Dessa maneira, algumas imagens podem transportar desde a alegoria do coração de um artista que lhe produziu até o gosto de toda uma sociedade.

Referências bibliográficas

FRANCASTEL, Pierre. A Realidade Figurativa. São Paulo: Perspectiva, 1983



[i] https://pt.wikipedia.org/wiki/S%C3%B3crates Acesso em 02 de julho de 2019
[ii] https://pt.wikipedia.org/wiki/Reino_de_Deus Acesso em 02 de julho de 2019

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