A Simbolização da Grandiosidade pelo Indivíduo


A Simbolização da Grandiosidade pelo Indivíduo


 Joaquim Luiz Nogueira 
A construção do Individuo pelo símbolo - Parte 5 

Pressupomos que todo indivíduo seja finito enquanto matéria, no entanto, ele também se depara com grandezas como o universo, que indica certo limite de seu conhecimento humano. Este espaço indeterminado e inumerável se contrasta com a limitação de cada pessoa, cujo desejo de participar desta vastidão permanente, leva a se identificar com esta grandiosidade que lhe parece eterna.
Ao se contrastar a limitação de cada ser com o ilimitado que o cerca, a mente também produz uma imagem da beleza representativa idealizada nesta amplitude, pois, “O belo é uma representação simbólica do infinito, pois assim fica ao mesmo tempo claro como o infinito pode aparecer no finito” (TODOROV, 2014, p.316).
Desse modo, o indivíduo se constrói de maneira que ele possa intercalar o belo entre as falhas de suas limitações ou trajetória, e neste sentido, muitas vezes, emprega esta qualidade por meio de representações simbólicas.
Ao representar essas qualidades de grandeza infinita, o indivíduo também incorpora às virtudes atribuídas a mesma e que ele a considera como posturas ideais. E, uma vez incluídas, o sujeito se vangloria da sensação de totalidade das mesmas e passa a ajustar sua necessidade com base nelas.

Os objetos assim representados parecem existir por si mesmos apenas e são, porém, significativos no mais profundo de si mesmos, e isso por causa do ideal, que sempre carrega consigo uma generalidade. Se o simbólico indica ainda outra coisa além da representação, será sempre de maneira indireta (TODOROV, 2014, p.317).




O indivíduo se constrói via representação de algo que lhe é ausente, sendo suas ações, na maioria das vezes axiomáticas, isto é, incontestável para ele, pois naquele momento lhe parecia à única saída. São respostas captadas, percebidas, simbólicas. “O símbolo é próprio à maneira intuitiva e sensível de apreender as coisas” (TODOROV, 2014, p.317).
O símbolo fala com o indivíduo por meio de pensamento e ideias, isto é, quando ele tem a compreensão ou juízo de algo, houve uma conexão simbólica, que lhe apresentou rumos, cenários, entre outros, “Assim, o símbolo dirige-se à percepção” (TODOROV, 2014, p.319).
A construção do indivíduo se dá por meio de modelos ou padrões em que, ele próprio o interpreta no sentido de estar preso a uma espécie de molde. A identificação pessoal se revela como resultado de uma ordem maior. “O simbólico é o exemplar, o típico, o que permite ser considerado como a manifestação de uma lei geral” (TODOROV, 2014, p.320). 
Um mesmo símbolo pode fornecer resultados diferentes para cada indivíduo e são essas soluções diversificadas, que geram conotações e interpretações que constituem sujeitos distintos. “O símbolo produz um efeito e, somente através dele, uma significação” (TODOROV, 2014, p.321).
Podemos pressupor que o indivíduo, também é simbólico, pois ele tem dificuldades para se identificar, nesse sentido, basta nos referirmos à frase filosófica atribuída ao filósofo grego Sócrates “Conheça a Ti Mesmo”. A pessoa pode se identificar com um nome, uma ideia, porém, sua resposta esconde a participação de outras representações. “O objeto simbólico, ao mesmo tempo, é e não é idêntico a si mesmo”. (TODOROV, 2014, p.323).
O indivíduo enquanto objeto simbólico pode se qualificar com a mescla daquilo que é, e a coisa que deseja ser, mesmo que seu ideal seja grandioso ou infinito. Desse modo, ele pode não simplesmente se identificar, mas se sentir como parte do eterno, ou seja, com qualidades idênticas por meio desta fusão.

Quanto ao símbolo, ele se caracteriza pela fusão desses dois contrários que são o geral e o particular, ou segundo a formulação preferida por Schelling, porque o símbolo não apenas significa, mas é, ou seja, pela intransitividade do simbolizante. No símbolo “o finito é ao mesmo tempo o infinito mesmo e não apenas o significa” (TODOROV, 2014, p.330).

Nesta situação ocorre a junção entre o sujeito, objeto em processo de construção e a fase completa de sua escolha, isto é, ele se sustenta com algo que considera de extrema relevância, a ponto de se sentir como parte integrante daquilo em que acredita. “O símbolo é, (...) funde significante e significado” (TODOROV, 2014, p.338).
O procedimento de estruturação do indivíduo pela coisa que ele considera como ideal, acontece de forma concomitante com sua ação presente. Todo ato, incorpora um passo no sentido de um ideal imaginado. “Há no símbolo uma simultaneidade entre o processo de produção e seu acabamento; o sentido só existe no momento de seu surgimento (...) o símbolo é capaz de exprimir o indizível” (TODOROV, 2014, p.340).
Para exemplificar a atuação do símbolo no indivíduo, Todorov recorre a Creuzer[1], que compara o símbolo ao “relâmpago que de uma só vez ilumina a noite escura” (TODOROV, 2014, p.342). Essa espécie de faísca é interpretada também pelo indivíduo como luz, imagem, concepção, inteligência, pensamento, entre outros.
Todorov nos explica que o ato simbólico é quando o indivíduo se posiciona no mesmo âmbito daquilo que ele julga também pertencer. Desse modo, a pessoa passa a ter a mesma competência do objeto que lhe representa no momento presente.



Não é uma relação de identidade, como acredita outros (nesse caso não mais haveria simbolização), mas de pertença; o símbolo é o ser, no sentido de fazer parte dele “Da pertença ao símbolo, tal como entendem os primitivos, a transição pode ser imperceptível. Pois o símbolo, assim como a pertença, participa do ser ou objeto que ele “representa”, e com isso mesmo garante a sua presença atual” (TODOROV, 2014, p.378).

Quando nomeamos um objeto pela sua aparência ou cor, por exemplo, chamamos a fruta laranja pela sua tonalidade, e esta, passa a ser reconhecida pela sua pigmentação. De modo semelhante, a simbolização de uma coisa qualquer, faz associação com outra via sentido, isto é, significado que conecta presença, indivíduo e finalidade.
Os gregos definiam isso com a palavra “trópos”, espécie de curva ou desvio, que facilitava a retórica, pois criava um jogo, cujo sentido da coisa não era nítido e poderia também manifestar outros aspectos. E deste modo, similarmente, Todorov nos afirma que “os símbolos têm parentesco com os tropos[2]” (TODOROV, 2014, p.380).
Outra figura de linguagem que podemos citar é a sinédoque[3], palavra grega “synekdokhé”, que significa a compreensão de várias coisas ao mesmo tempo. Tal artifício é empregado quando o indivíduo generaliza um determinado conceito, ou seja, toma uma parte pelo todo.


Esses recursos em que referimos acima estabelecem que os indivíduos façam construções ou desenhos, simbolizando coisas que possam conectar diferentes objetos: pegada (rastro) e homem, casa e habitante. Trata-se de uma relação que emprega a metonímia, o indivíduo, troca uma palavra pela outra, devido às relações de contiguidade, isto é, proximidade do vestígio com a coisa ou lugar.
Tal desenho só tem sentido quando gravado em um objeto particular; é através da relação metonímica de lugar que ele ganha sentido. O mesmo acontece com a moradia que simboliza seu habitante, ou a pegada e o homem (TODOROV, 2014, p.381).

A relação de associação entre um nome e uma coisa faz com que o indivíduo considere que tal realidade é parte da outra. Neste sentido, “todo ataque ao nome (ou ao símbolo) – é um ataque ao ser – pois um faz parte do outro” (TODOROV, 2014, p.382).
Nesta perspectiva, temos também as representações e imitações, cujo indivíduo, coloca em pratica aquilo que ele desejaria que acontecesse. Para isso ele evoca palavras, faz gestos e se comporta de modo previsto, segundo sua vontade, isto é, suas ações criam a realidade.

Do fato de o simbolizante ser parte do simbolizado: representar ou dizer uma coisa já é fazê-la existir. Assim, as predições se realizam não porque os adivinhos saibam ler o futuro, mas porque essas palavras dão vida ao que designam (TODOROV, 2014, p.383)

De acordo com acontecimentos inesperados, o indivíduo busca a todo instante certo equilíbrio e ao se deparar com situações desconfortáveis, todo esforço é concentrado no sentido que se estabeleça a igualdade com aquilo que o sujeito reconhece como justiça. Todorov nos aponta esta conexão da seguinte forma “Eis-nos, portanto, diante de uma nova relação, própria dos sistemas de símbolos; poderíamos chamá-la de equivalenciação” (TODOROV, 2014, p.385).
O indivíduo pode corporificar várias coisas a partir de uma frase que seja por ele pronunciada ou que tenha presenciado. Neste caso, a sentença do tempo atual simboliza todas as outras e as tornam presentes, mesmo que estejam ausentes. Trata-se do termo de condensação de Freud, citado por Todorov:

A condensação é a relação entre uma frase presente e uma ou várias frases ausentes (que a primeira simboliza segundo este ou aquele processo) (...) é uma relação entre duas ou mais unidades, todas presentes (TODOROV,2014, p.404).

Assim, o indivíduo toma para ele via representação, palavras, frases, objetos e coisas, que possam acrescentar nele o sentido da grandiosidade. Ele se constrói como pertencente a um universo maior, criador de uma nova realidade, na qual, se posiciona como aquele que é justo, revestido de valores ideais. 


[1] Georg Friedrich Creuzer foi filólogo, arqueólogo, orientalista e mitólogo alemão. Filho de um encadernador de livros, estudou na Universidade de Jena indo em seguida para Leipzig onde deu aulas particulares. https://pt.wikipedia.org/wiki/Georg_Friedrich_Creuzer Acesso em 22 de abril de 2017.
[2] Recurso expressivo em que se associa o sentido de uma palavra a outra, à qual é dado um  sentido diferente do literal (é o que acontece, por exemplo, na comparação, metáfora ou metonímia).  Do grego trópos, «volta; desvio», pelo latim tropu-, «idem» https://www.infopedia.pt/dicionarios/lingua-portuguesa/Tropos.  Acesso em 03 de julho de 2017.
[3] Recurso expressivo que se baseia numa relação de compreensão em que se designa o todo pela parte ou a parte pelo todo, o plural pelo singular ou o singular pelo plural, etc. (ex.: o homem por a espécie humana) Do grego synekdokhé, «compreensão de várias coisas ao mesmo tempo», pelo latim synecdŏche-, «idem» https://www.infopedia.pt/dicionarios/lingua-portuguesa/sin%C3%A9doque  Acesso em 03 de julho de 2017.


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