Joaquim Luiz Nogueira
Peregrinações
Históricas da Educação e do conceito de Cultura
Zygmunt
Bauman, aponta em seu livro “A cultura No Mundo Líquido Moderno” alguns conceitos interessantes, que se
considerarmos a Educação como produto de uma cultura, logo temos a questão: o
que é desejável ou indesejável para um Professor ou Professora?
São
profissionais que encaram com desprezo
os gostos e preferências dos alunos por funk , punk e dança de rua, julgando
como falta de gosto pela ópera ou música clássica. Ao mesmo tempo que a grande arte de hoje, a moda e a mídia, ambas,
valorizam uma mistura que é um pouco de tudo, sendo esta a luz que nos
recomendam.
Estamos
em época de mudança segundo Bauman, mesmo a elite política e econômica que no
passado detestava o esnobismo das classes populares com suas linguagens e
danças vulgares, agora passam a consumir esses produtos como arte, ou seja, nada deve ser estranho, o
que deve ser evitado é o hábito de selecionar o antigo para se sentir em casa
frente as novidades.
O
conceito valorizado atualmente é de acordo com Bauman: “não seja enjoado,
exigente e consuma mais”. Devemos formar
a base da pirâmide com este pensamento. Pertencer a uma classe social e ter preferências é algo do passado segundo
Pierre Bourdieu. Eram elementos usados para construção de fronteiras entre
pessoas educadas e não educadas, ou seja, manter as diferenças ou ambientes
exclusivos.
Havia o
gosto das altas elites e aqueles da classe média e o gosto vulgar, este,
venerado pela classe baixa. Para Bauman, misturar essas preferências era algo
tão impossível como juntar fogo e água.
A educação tradicional se manifestava acima de tudo como um dispositivo
útil, destinado a assinalar diferenças de classe e salvaguardá-las como uma
proteção das hierarquias sociais.
A
educação, assim como a cultura, se deve ao Iluminismo a incorporação de parte
de seu significado original que seria segundo Bauman “um agente da mudança do status quo, e não sua preservação, ou,
mais precisamente, um instrumento de navegação para orientar a evolução social
rumo a uma condição humana universal ...Apontar um objetivo e uma direção para
futuros esforços”.
Os nomes
“cultura/educação[1]”
segundo Bauman, foram “atribuído a uma
missão proselitista, planejada e empreendida sob a forma de tentativas de
educar as massas e refinar seus costumes, e assim melhorar a sociedade e
aproximar o povo, ou seja, os que estão na base da sociedade, daqueles que
estão no topo”.
A
“educação/cultura” de acordo com Bauman,
eram associadas a um feixe de luz, capaz de ultrapassar os telhados das
residências rurais e urbanas para
atingir os recessos sombrios do preconceito e da superstição que como tanto
vampiros (acreditava-se), não sobreviveriam quando exposto à luz do dia
Matthew
Arnold, escreveu em 1869 em seu livro (Culture or Anarchy) “a cultura (educação) busca eliminar as classes, generalizar por toda parte o
melhor que se pensa e se sabe, fazer com que todos os homens vivam numa
atmosfera de luz e doçura”.Matthew, escreveu em Literature and Dogma, de 1873,
“ a cultura é a fusão dos sonhos e desejos humanos com a labuta daqueles
dotados de disposição e capacidade de satisfazê-los” A cultura e a educação são
paixões pela doçura e pela luz.... É a paixão por fazê-los prevalecer.
Segundo
Bauman, “o termo cultura /educação entrou no vocabulário moderno como uma
declaração de intenções, o nome de uma missão a ser empreendida. O conceito de
cultura/(educação) era em si um lema e
um apelo à ação. De acordo com Bauman, “O conceito que
forneceu a metáfora para descrever sua intenção (a noção de agricultura,
associando os lavradores aos campos por eles cultivados) ....um apelo ao
camponês e ao semeador para que arassem e semeassem a terra infértil e enriquecessem a colheita pelo cultivo”.
A
Cultura / (educação) nas afirmações de Bauman “compreendia um acordo planejado
e esperado entre os detentores do conhecimento (ou pelo menos acreditavam
nisso) e os ignorantes (ou aqueles assim descritos pelos audaciosos aspirantes
ao papel de educador); um acordo apresentado...; endossado e efetivado sob a
direção da (classe instruída), que buscava o direito de moldar uma (nova e
aperfeiçoada) ordem a partir das cinzas do Antigo Regime.
Enfatiza
Bauman, “a intenção declarada dessa classe era a educação, o esclarecimento, a
elevação e o enobrecimento de Le peuple recém-entronizado no papel de de citoyen deo recém-criado État-
nation,aquela junção de nação recém formada que se alçava à condição de Estado
soberano com o novo Estado que aspirava ao papel de curador, defensor e
guardião da nação”.
O
projeto Iluminista do Estado Nação “acreditava-se que o incremento do número de
potenciais trabalhadores-soldados iria
aumentar e garantir sua segurança. Entretanto, como o esforço conjunto de
construção da nação e de crescimento econômico também resultava num crescente
excedente de indivíduos (em essência, categorias inteiras da população deviam
ser confinadas no depósito de lixo para que a ordem almejada pudesse nascer e
se fortalecer, e para que se acelerasse a criação de riquezas).
O
Estado Nação recém estabelecido, de acordo com Bauman, “logo enfrentou a
necessidade urgente de buscar novos territórios além de suas fronteiras,
territórios capazes de absorver o excesso de população que ele não conseguia
mais acomodar dentro de seus próprios limites. A perspectiva da colonização de
amplos domínios revelou-se um estimulo poderoso à ideia iluminista de cultura e
deu a missão proselitista uma nova dimensão, potencialmente global ....salvar o
selvagem de seu estado de barbárie”
Bordieu, afirmou que “na Metrópole , onde eram
elaborada elaboradas as visões do futuro aguardado e postulado; fragilizava-se
menos na periferia do império, de onde as forças expedicionárias eram obrigadas
a retornar muito antes de equiparar a realidade da vida dos nativos aos padrões
esposados na metrópole”.
Em
resumo, Bauman nos diz que “a cultura / educação agora se assemelhava a um
dispositivo homeostático: uma espécie de giroscópio protegendo o Estado Nação
de ventos e correntes cambiantes e ajudando-o, apesar das tempestades e dos
caprichos de um clima mutável, a “manter o navio no curso correto”.
Para
Bauman, a cultura/educação agora é capaz
de se concentrar em atender a necessidade dos indivíduos, resolver problemas e
conflitos individuais com os desafios e problemas da vida das pessoas....A
cultura/educação ... é modelada para se ajustar à liberdade individual de
escolha e à responsabilidade, igualmente individual, por essa escolha; e que
sua função é garantir que a escolha seja e continue a ser uma necessidade e um
dever inevitável da vida.
A
responsabilidade pela escolha e suas conseqüências, segundo Bauman, foram
colocadas pela condição humana líquido-moderna – sobre os ombros do individuo,
agora nomeado para a posição de gerente principal da “política da vida”, e seu
único chefe executivo.
Para
Bauman, estamos numa era pós paradigmática e que se juntou à famíla (que cresce
depressa) das “categorias zumbis” referida por Ulrich Beck ou como preferia
dizer Jaques Derrida “A Modernidade Líquida é a arena de uma batalha constante
e mortal travada contra todo tipo de paradigma – e, na verdade, contra todos os
dispositivos homeostáticos que servem ao conformismo e à rotina ... que mantêm
a previsibilidade”.
De
acordo com Bauman, “Hoje a cultura/(educação) consiste em ofertas, e não em proibições
em proposições, não em normas” Bordieu observou , a cultura/(educação) agora está engajada em fixar tentações e
estabelecer estímulo, em atrair e seduzir, não em produzir uma regulação
normativa; nas relações públicas e não na supervisão policial; em produzir,
semear e plantar novos desejos e necessidades ....não é a conservação do estado
atual, mas a poderosa demanda por mudança constante.
Ao
contrário da fase Iluminista, afima Bauman,
“se trate de uma mudança sem direção, ou sem um rumo estabelecido de
antemão. Seria possível dizer que ela serve nem tanto às estratificações e
divisões da sociedade, mas a um mercado de consumo orientado para a
rotatividade.
Vejamos
nas palavras de Bauman: “a nossa é uma
sociedade de consumidores, em que a cultura (educação) , em comum com o
resto do mundo por eles vivenciado, se manifesta como arsenal de artigos
destinados ao consumo, todos competindo pela atenção...todos tentando prender
essa atenção por um período maior....ela afasta todos os rígidos padrões e
exigências, aceita todos os gostos com imparcialidade ... com flexibilidade de
predileções (termo politicamente correto
com que hoje designa a falta de coragem). Essa é a marca da estratégia
recomendada como mais sensata e mais correta.
Hoje o
sinal de pertencimento a uma elite cultural/educada segundo Bauman, significa “o máximo de
tolerância e o mínimo de seletividade. .. o princípio do elitismo cultural é
onívoro” Semelhante animais que se alimentam tanto de carne quanto de vegetais.
Devemos ser capaz de agradar a todos.
As
forças que impulsionam a gradual transformação do conceito de
“cultura”/educação em sua encarnação líquido moderna, segundo Bauman “são as
mesmas que favorecem a libertação dos mercados de suas limitações não
econômicas, sobretudo sociais, políticas e étnicas...orientada para o
consumidor, baseia-se no excedente das ofertas, no rápido envelhecimento e no
definhamento prematuro do poder de sedução....a única forma de separar
realidade e pensamento positivo é multiplicar
as tentativas e cometer equívocos” .
Bauman
conclui que “A cultura / (educação) hoje se assemelha a uma das seções de um
mundo moldado como uma gigantesca loja de departamentos em que vivem, acima de
tudo, pessoas transformadas em consumidores ...as prateleiras estão lotadas de
atrações trocadas todos os dias ...Esses produtos ... são calculados para
despertar fantasias irripremiveis, embora por sua própria natureza, momentâneas...Arte
de sedução com o impulso do potencial cliente de conquistar a admiração de seus
pares e desfrutar uma sensação de superioridade.
A
cultura /(educação) da modernidade líquida de Bauman “tem clientes a seduzir. A
sedução, em contraste com o esclarecimento e a dignificação, não é uma tarefa
única, que um dia se completa, mas uma atividade com um fim em aberto. A Função
da cultura/(educação) não é satisfazer necessidades existentes, mas criar
outras – ao mesmo tempo que mantém as necessidades já entranhadas ou
permanentemente irrealizadas. Sua principal preocupação é evitar o sentimento
de satisfação em seus antigos objetos e encargos” (....)..
Cultura no mundo líquido moderno / Zygmunt Bauman/ Rio de Janeiro: Zahar 2013
[1]
A palavra educação é grifo meu, pois considero que se trata de um instrumento
da cultura.